Sua Majestade, O Bardo

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Valença, Bahia, Brazil
Escritor, autor do livro "Estrelas no Lago" (Salvador: Cia Valença Editorial, 2004) e coautor de "4 Ases e 1 Coringa" (Valença: Prisma, 2014). Graduado em Letras/Inglês pela UNEB Falando de mim em outra forma: "Aspetti, signorina, le diro con due parole chi son, Chi son, e che faccio, come vivo, vuole? Chi son? chi son? son un poeta. Che cosa faccio? scrivo. e come vivo? vivo."

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Réquiem para Lídice & My Lai

Réquiem para Lídice & My Lai

Salvador; 13 de janeiro de 2008 (20h23)

I – Lídice

Há quem chore pelos submersos do Arizona.
Eu choro por Lídice.
Choro por ti, que foste martirizada pela Liberdade.
Tu, que foste apagada da vida,
Que teus frutos foram dispersos,
Que teu futuro foi chacinado covardemente,
Que foste transformada em pó
Pela fúria sanguinária, sem perdão nem razão,
Por alguém que se julgava Deus.
Tu, cujo cadáver foi exposto profanamente como exemplo,
É por ti que eu choro.
Mas tu não foste esquecida!
De tuas cinzas e de teus trapos
O homem fez uma bandeira.
De tuas sombras o homem construiu faróis
E tu, minha Lídice, renasceste
Como Campo Santo, como campo de memória
Onde todos poderiam dizer: Barbárie nunca mais!

II – My Lai

Há quem chore pelas Torres Gêmeas.
Eu choro por My Lai.
Todos viram as torres voltando ao pó,
Todos viram a fumaça maculando a cidade,
Todos viram a inocência ser consumida pelo fogo,
Mas quem viu ou chorou por My Lai?
As árvores perderam os frutos,
As flores foram cortadas por baionetas,
No meio da selva tropical,
Apenas os abutres souberam da colheita humana,
Colheita insana de uma guerra sem razão.
Quem chorou pelos frutos da colheita de My Lai?
Só um anjo, curioso anjo vingador, freou a insensatez,
Sensibilizado pela colheita macabra
Que se fez naqueles arrozais na Indochina…
Muito choraram pelas Gêmeas, mas quem chorou por My Lai?
Mas que fez a messe em My Lai?
Ah, minha amiga História, tu és a Nêmesis implacável!
O mesmo ceifador de My Lai chorou pelas Gêmeas.
A mesma mão que fez o mal provou o amargo fruto,
Que surgiu na colheita de My Lai…
Será que agora o ceifador irá chorar por My Lai?

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Triste Valença

Triste Valença

Valença, 09 de fevereiro de 2005 (02h03)

Triste cidade de Valença,
Quanto lamento tua sina!
Quanto lamento teu fado!
Ao olhar teu glorioso passado
E confrontando–o co’o presente ingrato,
Minhas lágrimas descem em negro
Caudal e meu coração s’enfurece.
Minhas lágrimas se unem ao rio Una
Como atabaques de guerra e clamam
Por ti, amada cidade natal.
Tu, que foste Níobe de pensadores e escritores,
Que viu teu filho conselheiro
Empunhar a douta espada liberal
E desafiar o trono do imperador
Ao clamar por mais liberdade;
Tu que respiraste o progresso imperial
E viu a utopia socialista florescer
Dentro de um país celeiro
De escravos, latifúndio e misérias;
Tu que fostes a Decidida
E teus filhos brilharam impávidos
Como cometas durante a noite de Pirajá;
E que foste também a Hospitaleira
Para salvar as vítimas de Hitler;
Não podes ser um fantasma refletido
Nas águas negras do teu Rio Una!
Teu Mercado Municipal foi mercado
Para morte no monturo de lixo da História.
Tua jovem prole vaga louca
Sem educação, sem filosofia nem guia.
Arrochado em enlatados culturais,
E seguem alienados atrás do barco dos insensatos.
Como podem estar dispersos
Tantas jovens forças que t’iluminariam,
Cidade querida e maltratada?
Como pode estar esquecida
Pelos teus próprios filhos?
Tanto tesouro natural,
Tanto criativo potencial
Ser disperso, mal gerido, mal cuidado?
Sem museu que te preserve do êxodo,
Sem ouro e progresso que te levante,
Sem teus estaleiros que fizeram História
E de onde partisse a tua nau do futuro,
Eu vejo alguns teimarem falidos feudos
E fecharem teus vôos pelo horizonte
Além das costas do Brasil e do Mundo.
Minha cidade, tuas pedras nas ruas
Estão sujas e terrivelmente nuas.
Sujas de provincianismo,
Sujas de abandono e desvalidos,
Nuas de homens de fibra
Que declare guerra à apatia
E te vista de notável ousadia
E que te queria ver crescer,
Valença querida.
Valença, Vulcano precisa te reconquistar,
Minerva precisa restabelecer seu trono
Em tuas praças e nos corações dos jovens,
Mercúrio precisa trazer mais mercadores de alhures
Para multiplicar tuas riquezas e teus talentos
De prata e sapiência,
Ceres precisa reaver sua foice
E ceifar de ti a ignorância
E plantar nos corações
De teus filhos o amor a ti,
O amor que emule e faça de minha Valença
A cidade mais bela e próspera do Universo…

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Mulheres sem Vergonha… de escrever sobre sexo.

Mulheres sem Vergonha… de escrever sobre sexo.

Neste final de ano de 2007, a escritora Raquel Pacheco lançou o seu terceiro livro, “Na Cama com Bruna Surfistinha”, pela editora Panda Books. O tema da central da obra é… sexo. Ou seja, as memórias e experiências como a ex-garota de programa Bruna Surfistinha (fenômeno na internet por conta do seu blog, em que comentava sua atividade profissional). Com este livro, Raquel Pacheco consolida uma tendência deste início de milênio em que mulheres escrevendo textos eróticos sem preconceitos ou falsos pudores. Tendência essa já observada por Carlos Freire, no artigo “O sexo é delas”, no caderno de cultura do jornal galego “Faro de Vigo” em outubro deste ano.

Ainda em 2007, a também ex-garota de programa Vanessa de Oliveira lançou seu segundo livro, “100 segredos de uma garota de programa” e Belle (pseudônimo) lançou “Swing – a vida real de uma praticante de troca de casais”, em que ela descreve os bastidores do mundo do swing e sexo grupal junto com seu marido. Ambos os livros foram editados pela editora Matrix.

Desde 2001, com o lançamento do polêmico “A Vida Sexual de Catherine M.”, em que a crítica francesa de arte, Catherine Millet, falou abertamente sobre suas aventuras sexuais; as mulheres estão escrevendo livros em que falam sexo. Mas com uma nova abordagem sobre o sexo: Sem o proselitismo de quem está defendendo uma vida sexual liberada, sem o sentimento de culpa de quem fez algo condenável, nem com certa idealização romântica normalmente atribuída às mulheres de que o sexo deve está preso ao amor. Pelo contrário, o que se ver é uma literatura erótica em que as mulheres confessam normalmente que sente desejo e que nas relações são os homens quem tem a função de objectos sexuais.

Dentro deste filão se destaca as memórias e diários de ex-garotas de programas. Raquel Pacheco – apelidada de “Paulo Coelho do sexo”– havia lançado “O Doce Veneno do Escorpião” e “O que aprendi com Bruna Surfistinha”, em que contava não só sobre os motivos que levou à prostituição, como foi sua vida neste período e como foram os primeiros momentos de fama. Vanessa de Oliveira estreou com “Diário de Marise”, também sobre sua vida como garota de programa. Mas este fenômeno não é restrito ao Brasil. Na Europa também foram lançados livros similares. A espanhola Alejandra Duque lançou em 2006 “A Agenda de Virgínia” pela Editora Planeta (a mesma que edita Paulo Coelho no mercado hispânico), sobre a prostituição de luxo em Barcelona e a portuguesa Carla de Almeida romanceou a vida da prostituta Diana em “300 Clientes Habituais”.

Mas não só de prosa memorialística vive este segmento. Também na ficção as mulheres estão escrevendo literatura erótica com desenvoltura antes atribuída aos homens. A dramaturga Ana Ferreira estreou em no romance com o livro “Amadora” (Geração Editorial/2001), em que a personagem central vive diversas aventuras sexuais, incluindo orgias, lesbianismo e incesto. Já a roqueira Syang lançou seu livro de contos “No Cio”. Na poesia, dentre tantos exemplos, destaca-se a catarinense Angela Bretas, em cujo site www.angelabretas.com (indicado pela UNESCO como um dos melhores sites de literatura) pode se encontra na página “verso e prosa” a sessão “Românticas Eróticas”. Estes exemplos respondem à pergunta da jornalista Ruth de Aquino, cujo artigo “Agora é moda ser pornô” na edição de janeiro de 2002 da revista Playboy, que comentava a recente produção erótica feminina francesa e perguntava se esta tendência chegaria ao Brasil.

PASSADO DIFERENTE: Se no início do 03º Milênio as mulheres estão livres para escrevem com liberdade sobre seus desejos e taras sem que isso cause constrangimento, até o século passado a história era diferente. No século XX – século marcado pelo feminismo – poucas foram as mulheres que se notabilizaram por este gênero literário. A escritora franco-americana Anaïs Nin, no prefácio de seu livro de contos eróticos “Delta de Vênus” já percebia que “os mistérios da sensualidade da mulher, tão diferente da sensualidade do homem” ainda não for devidamente retratado na literatura, uma vez que “a linguagem do homem era inadequada”. Curiosamente ou não, Anaïs Nin se firmará na literatura pelo erotismo, quer nas obras de ficção, como o romance “Uma espiã na casa do amor”, quer nos seus diários, em especial, “Henry e June”, que descreve seu caso amoroso com o escritor americano Henry Miller e a esposa dele. Ainda no século XX, destacam-se as escritoras brasileiras Hilda Hist e Cassandra Rios e a francesa Anne Desclos, que sob o pseudônimo de Pauline Reage, lançou “A História de O” – um romance erótico cujo tema é o sadomasoquismo, na tradição do “Justine” e “120 dias de Sodoma”, do Marquês de Sade.
Já do século XIX para trás, a voz feminina da literatura erótica encontra-se muda. Com a exceção de Safo e Margarida de Navarra, o que existe é o império masculino. Mesmo num romance de autoria anônima como “Teresa Filósofa”, se percebe o dedo masculino. Embora a personagem título do romance seja uma mulher camponesa que, em pleno final do século XVIII vai vivendo aventuras sexuais na alcova ao mesmo tempo em que aprendia a filosofia dos iluministas, a posição que ela aceita de ser uma mera amante de um rico e jovem nobre, renunciando inclusive a maternidade, para manter a ordem social até então vigente.

Depois de quase três mil anos de império masculino na literatura erótica, agora chegou a vez destas mulheres sem vergonha… que escrevem com naturalidade sobre seus desejos, taras, amores e sonhos; sem a menor culpa, sem medo e (principalmente), sem preconceito.

Bibliografia
NIN, Anaïs. Delta de Vênus. Histórias eróticas. Tradução de Lúcia Brito. Porto Alegre: L&PM, 2006. (Coleção L&PM pocket).
_________. Uma espião na casa do amor. Tradução de Reynaldo Gauarany. Porto Alegre, RS: L&PM, 2007. (Coleção L&PM pocket).
_________. Henry & June. Diários não-expurgados de Anaïs Ninn (1931-1932). Tradução de Rosane Pinho. Porto Alegre, RS: L&PM, 2007. (Coleção L&PM pocket).
_________. Fire, from “a journal of love”. The previously unpublished unexpurgated diary (1933-193). Prefácio de Rupert Pole a notas biográficas e Anotações de Gunther Stuhlman. Nova York: Harcourt Brace & Company, 1995
ANÔNIMO do século XVIII. Teresa filósofa. Prefácio de Renato Janine Ribeiro e tradução de Maria Carlota Carvalho Gomes. Porto Alegre: L&PM, 1997. (Coleção L&PM pocket).
SURFISTINHA, Bruna (Raquel Pacheco). O doce veneno do escorpião. O diário de uma garota de programa. São apulo: Panda Books, 2005.
PACHECO, Raquel. O que aprendi com Bruna Surfistinha. Lições de uma vida nada fácil. São Paulo: Panda Books, 2006.
OLIVEIRA, Vanessa de. O diário de Marise. A vida real de uma garota de programa. São Paulo: Matrix, 2005.
_________. 100 segredos de uma garota de programa. Tudo o que você queria saber sobre homens, sexo e a profissão. São Paulo: Matrix, 2007.

Belle. Swing. A vida real de uma praticante de troca de casais. São Paulo: Matrix, 2007.
DUQUE, Alejandra. A agenda de Virgínia. Uma prostituta de luxo revela sua vida dupla. Tradução de Magda Lopes. São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2006.
ALMEIDA, Carla de. 300 clientes habituais. São Paulo: Landscape, 2007.
MILLET, Catherine. A vida sexual de Catherine M. tradução de Cláudia Fares. Rio de Janeiro: Ediouro, 2001.
FERREIRA, Ana. Amadora. São Paulo: Geração Editorial, 2001.
SYANG. No cio. São Paulo: Clio, 2003.
AQUINO, Ruth de. Agora é moda ser pornô. Playboy. São Paulo: Abril, ano 27, nº 11, edição nº318, jan. 2002. 2007. p. 105.
FREIRE, Carlos. O sexo é delas: nova narrativa erótica feminina. Faro de Vigo. Caderno Faro da Cultura. Vigo (Pontevedra/Galiza/Espanha), 04 out. 2007. p. 01.

Publicado no jornal "Valença Agora" em janeiro de 2007 (http://www.valencaagora.com/x/b/bs.php?bl=1&menu=653)

Salvador, 21 de dezembro de 2007.

Ricardo Vidal, 29 anos, escritor. Autor do livro “Estrelas no Lago”. Participou de várias antologias e foi menção honrosa nos concursos de poesia da revista Iararana (2002) e da ALER (2005 & 2007). Fundador e ex-diretor da UMES-Valença (1994-1996). Estuda Letras/Inglês na UNEB-Salvador. Blog: www.bardocelta.blogspot.com. E-mail: cve_livros@hotmail.com

Biblioteca do Bardo Celta (Leituras recomendadas)

  • Revista Iararana
  • Valenciando (antologia)
  • Valença: dos primódios a contemporaneidade (Edgard Oliveira)
  • A Sombra da Guerra (Augusto César Moutinho)
  • Coração na Boca (Rosângela Góes de Queiroz Figueiredo)
  • Pelo Amor... Pela Vida! (Mustafá Rosemberg de Souza)
  • Veredas do Amor (Ângelo Paraíso Martins)
  • Tinharé (Oscar Pinheiro)
  • Da Natureza e Limites do Poder Moderador (Conselheiro Zacarias de Gois e Vasconcelos)
  • Outras Moradas (Antologia)
  • Lunaris (Carlos Ribeiro)
  • Códigos do Silêncio (José Inácio V. de Melo)
  • Decifração de Abismos (José Inácio V. de Melo)
  • Microafetos (Wladimir Cazé)
  • Textorama (Patrick Brock)
  • Cantar de Mio Cid (Anônimo)
  • Fausto (Goëthe)
  • Sofrimentos do Jovem Werther (Goëthe)
  • Bhagavad Gita (Anônimo)
  • Mensagem (Fernando Pessoa)
  • Noite na Taverna/Macário (Álvares de Azevedo)
  • A Casa do Incesto (Anaïs Nin)
  • Delta de Vênus (Anaïs Nin)
  • Uma Espiã na Casa do Amor (Anaïs Nin)
  • Henry & June (Anaïs Nin)
  • Fire (Anaïs Nin)
  • Rubáiyát (Omar Khayyam)
  • 20.000 Léguas Submarinas (Jules Verne)
  • A Volta ao Mundo em 80 Dias (Jules Verne)
  • Manifesto Comunista (Marx & Engels)
  • Assim Falou Zaratustra (Nietzsche)
  • O Anticristo (Nietzsche)