Escritor, formado em Letras (Inglês) pela UNEB/Salvador.
O escritor italiano Marinetti, no início do século passado, imaginou que a literatura do futuro teria na velocidade seu valor central. No mundo do futuro tudo é rápido e os textos se-riam telegráficos e bruscos como uma facada, em que a poesia diria o máximo com o mínimo de palavras. Isso parece se confirmar atualmente com a internet e os celulares. A necessidade de se passar à informação em tempo real criou novas formas minimalistas de literatura (como indrisos, poetrix e microcontos), que se adequam a esta nova linguagem seca e instantânea. Deste modo, haveria ainda espaço para uma literatura mais suave? Para a escritora Eliana Ma-ra Chiossi, a resposta é sim, como pode se ler no seu livro de estréia, «Fábulas Delicadas».
«Fábulas Delicadas» (editora Escrituras) é uma coletâneas de 107 textos em prosa (pu-blicados originalmente em blogues), divididos em nove sessões reunidas em um volume de 112 páginas. Os textos se constituem em um único parágrafo, onde Eliana narra e disserta so-bre fulgazes instantes capturados pela sua escrita feminina e contemporânea. Oficialmente, e-les estão catalogados como contos, mas a riqueza das expressões aliada com a suavidade com que a autora trata os temas os colocam próximos aos poemas em prosas de Charles Baudellai-re e Raul Pompéia.
Nos seus textos, a brevidade da narrativa não significou o surgimento de cortes cinema-tográficos secos, onde as idéias são lançadas rapidamente nos papel – como em «Pau Brasil», de Oswald de Andrade, e «Martim Cererê», de Cassiano Ricardo. Pelo contrário, delicada-mente Eliana conduz o leitor pelos textos do livro, em que concisão da palavra é como um ri-acho que serenamente encontra sua foz. Sua poesia é fluida e macia, mesmo quando trata de temas fortes (como em “Cenário” e “Face”). Aliás, a fluidez de sua escrita acaba refletindo nas imagens recorrentes ao campo semântico da água: rio, chuvas e ondas. Exemplo disso são os textos “Arquipélago” (‘Este rio destemperado e provisório, enchente e charco’) e “Embar-que” (‘Água tão cristalina, água convicta: sou uma mulher sozinha’).
Nesta linguagem diáfana o lírico convive com o humor, o místico, a saudade e a refle-xão, bem ao gosto da escrita feminina. Exemplo disso é o texto “Proprietária”, no qual Eliana fala de Jesus Cristo como alguém próximo e humano, quase uma criança pura similar ao me-nino Jesus descrito por Fernando Pessoa / Alberto Caeiro em “O Guardador de Rebanho” e di-ferente do Cristo crucificado institucionalmente nos altares. Como ela diz: ‘Jesus é Cristinho e é meu. Já ajustamos nossos idiomas. Ele sabe que eu o entendo’.
Com uma linguagem envolvente, «Fábulas Delicadas», de Eliana Mara, é um livro arre-batador, que traz instantes de suavidade e poesia em meio ao caos frenético da vida urbana.
Eliana Mara é escritora e professora universitária (Ufba e Uefs) paulistana radicada na Bahia, doutora em Estudos Literários Mantém o blogue “O mundo tem inscrições sempre a-bertas” (www.inscricoessempreabertas.blogspot.com) . Assina a sessão ‘Crônica Havaianas’, na revista literária digital “Verbo21” (www.verbo21.com.br).
Salvador, 27 de abril de 2010 (madrugada)
Um comentário:
Meu querido,
faz tempo que não visito teu espaço e encontrei esta resenha sua.
Sou suspeita em falar, porque obviamente mexe com a vaidade. Não vou me fazer de santinha do pau oco. Gostei em primeiro lugar pela lembrança, pela atenção a um livrinho que ainda me custa entender. Mas a resenha você faz com uma atitude amorosa, de leitura atenta, generosa.
E só tenho a agradecer.
Beijos
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